Existe emprego para quem não quer parar.
Aos
61 anos, Maria das Graças Nunes está aposentada, mas só no papel. Ela, que já
havia atuado em setores como o metalúrgico, o automotivo e o farmacêutico, foi
contratada há dois anos para a gerência de recursos humanos no negócio do grupo
petroquímico Mexichem, que no Brasil é dono das marcas de tubos e conexões
Amanco, Bidim e Plastubos. "Em nenhum momento me perguntaram sobre idade
no processo seletivo. Adoro trabalhar e tenho prazer em me sentir útil",
diz.
Ela
não pensa em parar - prova disso é que a mudança foi motivada pelo desafio de
implementar processos de "business partner" na estrutura de RH da
empresa e pela chance de atuar em um segmento que ela ainda não conhecia. Na
Mexichem, Maria das Graças trabalha com uma equipe de 12 pessoas, na qual a
mais velha tem 32 anos. "A troca de conhecimento é muito forte. Eu tenho a
experiência da vivência, e a nova geração é muito plugada, conhece um pouco de
tudo. Isso me alimenta", diz.
Segundo
a diretora de RH da Mexichem, Adriana Garcia, a empresa contratou no último ano
para cargos de gestão seis profissionais acima dos 50 anos. "Não colocamos
a idade como fator. O que acontece é que queremos o profissional que está
dentro de um determinado perfil, e isso não é afetado pela faixa etária dos
candidatos", explica. Em uma época em que a juniorização da mão de obra é
um fenômeno real, Adriana vê muitos ganhos em atingir um equilíbrio entre profissionais
mais maduros e os mais jovens no quadro da empresa. O próprio presidente da
companhia no Brasil tem menos de 40 anos.
A
postura da Mexichem, contudo, ainda não é comum no mercado de trabalho como um
todo. Segundo um estudo da Fundação Getulio Vargas (FGV) e da consultoria PwC,
realizado no ano passado, mais de 70% das 96 companhias consultadas não
incentivam a contratação de profissionais que já tenham se aposentado ou
estejam próximos da aposentadoria. Para 58% das empresas, a idade ainda é um
fator relevante na hora de contratar - e metade admite que prefere dar a vaga a
um profissional mais jovem em uma situação de igualdade de condições.
Em
pouco tempo, no entanto, essa abordagem não será mais tão sustentável. O Ipea
estima que, em 2040, aproximadamente 57% da população economicamente ativa terá
mais de 45 anos. Segundo um estudo com 16 mil pessoas em 15 países, entre eles
o Brasil, produzido pela organização sem fins lucrativos Transamerica Institute
em parceria com a seguradora Aegon e a consultoria Cicero, apenas 24% dos
brasileiros planejam parar de trabalhar completamente após a aposentadoria. O
resto se divide entre pessoas que, como Maria das Graças, não querem diminuir o
ritmo de trabalho, e outras que pretendem atuar em meio período.
No
último ano, a professora da FGV Maria José Tonelli, que participou da
formulação do estudo com a PwC, percebeu um pequeno movimento na direção de as
empresas verem profissionais mais velhos como alternativa à escassez de mão de
obra. Ela ressalta, no entanto, que os processos de transferência de
conhecimento não devem ser criados apenas quando a pessoa está de saída da
companhia. "É preciso que haja um esforço deliberado para mudar, pois isso
faz parte da cultura da organização", diz.
Embora
94% das empresas considerem que o principal benefício de empregar profissionais
mais seniores está na experiência que eles trazem, nem todas aproveitam essa
bagagem por meio de práticas formais de transferência de conhecimento.
Programas de mentoring e treinamento, por exemplo, são usados em, no máximo,
50% das companhias, segundo o estudo da PwC.
A
Mexichem tem um programa que identifica profissionais especialistas em
determinadas áreas técnicas, que no geral são mais seniores, e os capacita para
que possam transmitir o conhecimento a outros funcionários. A companhia também
não possui aposentadoria compulsória, o que permite vários outros casos como o
de Maria das Graças. "Muitas dessas pessoas já têm estabilidade financeira
e não estão aqui pela remuneração. É um sinal de que propiciamos um ambiente
agradável", diz Adriana.
O
headhunter Luiz Valente, da consultoria Talenses, percebe um aumento na
contratação de profissionais na faixa dos 60 anos como forma de contornar o
gargalo na disponibilidade de mão de obra qualificada. "Atualmente, nos
processos de recrutamento, as empresas pedem um tempo mínimo de experiência,
mas sem delimitar um máximo", diz.
De
acordo com Valente, existe um medo comum por parte dos empregadores de que os
custos para ter esses profissionais sejam altos, mas é preciso considerar que
os mais jovens costumam exigir uma aceleração mais rápida de carreira - o que
pode sair mais caro no longo prazo. "É preciso conseguir um equilíbrio na
estrutura salarial", diz. O especialista vê setores como os de infraestrutura,
energia e engenharia como mais abertos a absorver essa mão de obra, assim como
vagas que lidam com assuntos governamentais.
Adriana,
da Mexichem, também não concorda que os funcionários mais maduros significam
custos maiores. "As empresas ainda têm muito receio em razão da
remuneração e porque acham que a pessoa vai produzir menos. Minha experiência,
contudo, mostra o contrário", diz a diretora. Para ela, os mais velhos
costumam ter mais disponibilidade e comprometimento, além de tomarem decisões
mais rápidas e assertivas.
Claudio
Costa, diretor de gestão de pessoas da EcoRodovias, concorda que o investimento
na formação de um profissional mais jovem, combinado ao risco de perdê-lo para
o mercado, muitas vezes é maior do que trazer um profissional sênior.
A
empresa de infraestrutura, que dobrou de tamanho após uma série de aquisições
nos últimos anos, tem um processo bem formatado para contratar e promover
profissionais com mais de 55 anos. O objetivo é não só aproveitar a experiência
dos profissionais em um setor que exige maturidade, mas também preparar a
próxima geração de líderes. "Esses executivos têm a missão de formar
equipes. Eles vão transferir toda a bagagem para um profissional mais jovem,
com 30 anos de estrada pela frente", diz Costa. Com esse intuito, a
empresa começou a oferecer neste ano cursos de gestão de pessoas aos 150
líderes da companhia.
É
o caso de Valter Lana, contratado há menos de dois meses para a diretoria
executiva de desenvolvimento de negócios, aos 61 anos. "Abaixo dele, temos
um talento com menos de 30 anos que está sendo preparado para ser promovido
daqui a cerca de cinco anos", afirma Costa.
Para
ele, programas de formação como cursos de liderança são responsáveis apenas por
uma parte da formação do profissional, que não chega a 30%. "O resto é
andar com as próprias pernas. Cometer erros e aprender com eles. Com a presença
de alguém mais maduro, que já tenha passado por tudo isso, você assegura um
processo mais organizado", diz. O diretor adiciona que isso ajuda também
na retenção desse profissional quando ele recebe uma proposta do mercado. O
turnover da EcoRodovias nos cargos de liderança é de menos de 1%.
Luiz
Cezar Velloso, de 58 anos, entrou na companhia há um ano para dirigir o
escritório em Brasília. O executivo acumula mais de 40 anos na área rodoviária
e está aposentado há cerca de cinco anos. "Não tenho planos de parar.
Enquanto surgirem oportunidades com as quais eu possa contribuir, quero
continuar trabalhando. Sinto que minha experiência pode ajudar."
Recentemente,
foram contratados também quatro profissionais com mais de 55 anos e experiência
em consultoria - dois deles para fazer parte do RH, que nos últimos anos teve
aumento de custos e redução no quadro de pessoas. Isso resultou em economia na
contratação de consultorias externas. Para Costa, a melhor saída é o
equilíbrio. "Com uma gestão muito envelhecida, você não oxigena e não
inova rapidamente. O segredo está nesse mix entre jovens mais impetuosos e a
sabedoria daqueles que já passaram por muita coisa", diz.
Valor
Econômico.
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