Fiscais apontam grave risco de adoecimento no setor de telemarketing – não posso deixar passar em branco esse assunto que é uma afronta aos poderes públicos e a profissionais de segurança do trabalho.
Na
central de atendimento da Contax, só se entra com uma garrafa d´água e a roupa
do corpo - nada mais. O ponto começa a contar depois que o funcionário liga o
computador, coloca o fone no ouvido e digita sua senha. Se atrasar um minuto do
horário de entrada, perde bônus.
A
partir de então, um gerente faz a ronda, ditando ordens em voz alta. E há a
ronda virtual: cada palavra dita aos clientes é gravada para que a equipe de
escuta possa checar se o funcionário seguiu o script da empresa - e se o fez
com um "sorriso na voz". Se estiver num dia triste, perde bônus.
As
ligações entram continuamente pelo fone de ouvido, só param nos intervalos
determinados pela empresa: 20 minutos para o almoço e dois intervalos de 10
minutos para o banheiro ou água. No caso de um chamado da natureza, um
cronômetro marca o tempo que o funcionário leva para atender a urgência
fisiológica. Para não perder o bônus, alguns preferem trabalhar de fralda
geriátrica.
Além
de perder um complemento importante ao salário, quem não segue cada uma das
regras acima pode levar bronca do supervisor e corre o risco de entrar no que a
empresa chama de "linha de corte": um limbo que antecede a demissão
por justa causa. Uma vez na linha de corte, cada deslize vira advertência ou
suspensão. A maior aspiração dos funcionários é conquistar o que chamam de
"degrau da rua": a demissão sem justa causa.
Esse
é a rotina dos atendentes da empresa de telemarketing Contax, onde ficam as
principais centrais de teleatendimento do Bradesco, Citibank, Itaú, Santander,
Net, Oi e Vivo. A descrição acima foi baseada nos registros feitos pelo
Ministério do Trabalho durante mega fiscalização em 2014, quando unidades da
Contax em sete estados foram inspecionadas. O órgão considerou a terceirização
ilícita e responsabilizou os bancos e empresas de telefonia por um conjunto de
infrações de trabalhistas que somaram R$ 300 milhões em multas e R$ 1,5 bilhão
em débitos salariais.
Apesar
das exigências para que corrigissem as infrações, em janeiro desse ano os
auditores voltaram a encontrar os mesmos problemas nas centrais de atendimento
do Itaú, Bradesco e OI - todas sediadas na Contax de Recife, Pernambuco. Essas
centrais foram interditadas em 21 de janeiro por não atender a mudanças como,
por exemplo, parar de constranger o trabalhador a não usar o banheiro. Além de
contabilizar diversos casos de adoecimento, os auditores entenderam que as
violações sistemáticas apresentam um risco grave e iminente de adoecimento para
todos os operadores.
Mas
as centrais não ficaram muito tempo de portas fechadas. Um dia depois da
interdição, a Contax entrou com um mandado de segurança e conseguiu uma liminar
para voltar a funcionar. Com base na defesa da empresa, que diz estar
implementando as mudanças necessárias, a 14ª vara da Justiça do Trabalho de
Pernambuco não só liberou o funcionamento, como proibiu o Ministério do Trabalho
de emitir novas multas.
"Nós
continuamos a receber denúncias dos trabalhadores, mas estamos de mãos
atadas", alerta Cristina Serrano, uma das auditoras fiscais do trabalho à
frente da operação. "A empresa diz que está tomando providências, mas seus
funcionários nos procuram para dizer que continuam sofrendo os controles
excessivos. Recebemos denúncias de funcionários com infecção urinária,
depressão e síndrome do pânico que continuam trabalhando".
Para
piorar, novos problemas surgiram. No dia em que voltaram a trabalhar,
funcionárias da Contax gravaram vídeo no celular em que revelam a cor marrom da
água disponibilizada no bebedouro. Uma delas afirma que já pegou uma infecção
por conta disso.
Os
problemas de saúde foram o principal fator que motivou a interdição. Só em
2013, essa unidade recebeu mais de 23.000 atestados de afastamento devido a
lesões por esforços repetitivos e doenças osteomusculares. Os auditores
registraram alto índice de problemas psíquicos e identificaram grande risco
para a ocorrência de problemas vocais e de audição. "São todas doenças
resultantes da organização do trabalho: decorrentes de assédio moral, exigência
para que fiquem sentados na mesma postura por longos períodos, ritmo de
digitação acelerado", diz Odete Reis, médica e auditora fiscal responsável
pela parte de saúde e segurança da inspeção.
Sobre
esses números, a juíza Camila Augusta Cabral de Vasconcellos, que liberou o
funcionamento das centrais, julgou que "é plenamente possível que, em um
contingente de milhares de trabalhadores, como é o caso da Contax, alguns
apresentem enfermidades". Com um prédio que abriga 14.000 funcionários, a
média anual de atestados por esforço repetitivo da unidade supera o total de
trabalhadores contratados. A rotatividade é alta. Isso sem contar os atestados
por problemas psíquicos, de voz e de audição. A grande incidência de doenças
chama ainda mais atenção quando se considera que os funcionários são jovens:
83% têm menos 30 anos.
Em
recurso na Justiça do trabalho, a Advocacia Geral da União entrou com mandado
para pedir que a empresa feche as portas enquanto as mudanças não foram
comprovadamente implementadas. A Superintendência Regional do Trabalho e
Emprego de Pernambuco também entrou com um recurso. Os auditores argumentam que
a justiça não pode confiar apenas na boa vontade da empresa. Citam o caso da
Bahia, onde a Contax assinou um Termo de Ajustamento de Conduta em 2007 e, sete
anos depois, a fiscalização encontrou as mesmas irregularidades que já deveriam
ter sido corrigidas.
Em
nota, a Contax argumentou que é "a maior empregadora do município e a
paralisação das suas atividades, com possibilidade de perda dos contratos de
prestação dos serviços, acarretará em demissão em massa de mais de 10.000
funcionários, afetando a vida particular de cada um, gerando sofrimento e
angústia destes e de seus familiares, bem como a economia da localidade, sem
contar com a infinidade de impostos recolhidos". A empresa conclui o
comunicado afirmando que "cumpre toda a legislação trabalhista e as normas
específicas para o setor de call center e se mantém aberto ao diálogo com o
Ministério do Trabalho e Emprego".
Repórter
Brasil.
Nota
deste blog:
E
assim continua a acontecer os acidentes de trabalho no Brasil, está empresa
possui SESMT? Ainda existe este tipo de coisa no Brasil ? Vamos cobrar uma
posição mas enérgica do MPT - Ministério Público do Trabalho.
“Prevencionista, se você gostou, seja um seguidor e compartilhe com
seus amigos e um dia verá que essa sua atitude fez parte da sua história”.
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