Obras descumprem regras básicas e 199 operários morrem em 10 anos.

Trabalhador (Cerest), direta ou indiretamente, em todos os casos, as mortes ocorrem por falha das empresas responsáveis pela construção. O G1 teve acesso a informações de um relatório que mostra que até a obra mais importante da cidade, a de ampliação do Aeroporto Internacional de Viracopos, já infringiu normas básicas que existem para garantir a integridade do trabalhador da construção civil.
 
Manoel e Francisco, de 34 e 22 anos respectivamente, foram as duas últimas vítimas que inflaram esta cruel estatística. Os dois piauienses de sobrenome Silva chegaram ao local de trabalho, as obras de ampliação do Shopping Iguatemi, às 7h do dia 19 de maio, e suas famílias nunca imaginavam que eles não voltariam mais para a casa. Uma laje recém-concretada, de 125 metros quadrados, desabou, soterrando o futuro dos dois rapazes.
 
“Geralmente, tenta-se desqualificar o trabalhador, imputando a negligência a ele. Mas a verdade é que sempre a responsabilidade é da empresa, que expõe o trabalhador muitas vezes a jornadas excessivas e outros riscos. Além disso, a empresa também deve fiscalizar o descumprimento de normas de segurança”, disse o coordenador do Cerest, Alexandre Beltrami.
 
A Polícia Civil ainda apura as circunstâncias da morte dos dois operários do Iguatemi. O delegado do caso, Mauricio Lucenti Geremonte, instaurou inquérito de homicídio culposo, quando não há intenção de matar, além de acidente de trabalho e desabamento. As obras do local foram desembargadas nesta semana porque, segundo o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), após 10 dias interditada, as adequações de segurança do trabalhador foram feitas.
 
A construtora Método, responsável pela obra de expansão do shopping, afirmou ter oferecido apoio à família e garante que tem colaborado com os órgãos que trabalham na apuração das causas do acidente.
 
Viracopos:
 
Na tentativa de evitar outros acidentes e mortes em Campinas, o MTE também interditou parcialmente a obra de ampliação de Viracopos em 14 de maio e algumas atividades, como aquelas que envolvem tarefas em altura, ficaram impedidas de serem realizadas por nove dias, até que fossem feitas adequações para garantir a segurança dos operários.
 
Antes da interdição feita pelo MTE, no entanto, o Cerest, que é vinculado à Prefeitura, já havia feito uma tentativa de interdição, que foi questionada pela concessionária na Justiça. O G1 teve acesso a informações e imagens do relatório dos fiscais do Centro que estiveram na obra.
 
“Diante da pressão para o cumprimento do prazo de entrega do terminal, o que a gente vê ali é uma bandalheira. Há uma pressão da concessionária sobre as terceirizadas, que pressionam as quarteirizadas e as atividades são feitas ao mesmo tempo, com uma empresa cruzando a outra. Infelizmente, nessa situação, a segurança do trabalhador fica longe de ser uma prioridade”, conta Beltrami.
 
Risco até de explosão:
 
As obras de Viracopos foram readequadas, segundo o MTE e a concessionária, mas não se sabe por quanto tempo os trabalhadores foram submetidos aos riscos flagrados pelo Cerest e, posteriormente, pelo Ministério do Trabalho. Segundo o coordenador do Centro de Referência, além de um congestionamento de guindastes e de plataformas de trabalho aéreo sem a delimitação obrigatória de área de segurança, o que expunha o trabalhador a risco grave e iminente, as obras de Viracopos cometeram irregularidades consideradas básicas.
 
Segundo Beltrami, havia trabalhador sem equipamento de proteção individual, áreas com risco de explosão e incêndio, onde eram armazenados produtos inflamáveis sem os devidos cuidados, equipamentos sem manutenção, emendas de fios com a parte energizadas exposta, falta de extintores de incêndio, falta de proteção contra quedas (imagem ao lado), entre outras.
 
A concessionária Aeroportos Brasil Viracopos enfatizou em nota que as obras foram 100% liberadas em 23 de maio após as correções solicitadas pelos órgãos de defesa do trabalhador terem sido feitas. A empresa afirmou, ainda, que para o Consórcio Construtor de Viracopos “a segurança do trabalhador sempre foi premissa básica nas obras no local e que cumpre todas as normas exigidas pelas leis de segurança do trabalho”.
 
Perigo e imprudência:
 
De acordo com dados do Sistema de Informação de Agravos de Notificação, do Ministério da Saúde, o setor que mais concentrou acidentes fatais de trabalho entre os anos de 2011 e 2013 foi a construção civil. Pelas estatísticas, ela aparece seguida dos segmentos de comércio, transportes terrestres, administração pública e serviços.
 
Para Beltrami, um dos fatores que contribui para a incidência constante destas mortes é a impunidade. Ao contrário do que ocorre, por exemplo, em um acidente de trânsito causado por embriaguez, quando a Justiça entende que o condutor assumiu o risco de matar, nestes acidentes, os responsáveis, embora não tenham assegurado a segurança do trabalhador, respondem por homicídio culposo e, muitas vezes, conseguem atribuir à própria vítima a responsabilidade pelo ocorrido.
 
A punição ao patrão, na maioria dos casos, não passa da aplicação de uma multa. “A falta de punição e a cultura brasileira de imputar sempre culpa ao trabalhador não são nada pedagógicos e contribuem para que essas mortes aconteçam”, defende o coordenador do Cerest.
 
G1.
 
 
“Prevencionista, se você gostou, seja um seguidor e compartilhe com seus amigos e um dia verá que essa atitude fez parte da sua história”.

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