O Brasil quer mais encargos sobre a folha

O elevado peso dos encargos sobre a folha de pagamento no Brasil é constantemente apontado como um inibidor da geração de empregos e indutor da informalidade. Diversas são as propostas ou manifestações de economistas, políticos, gestores públicos, representantes de trabalhadores e de empregadores no sentido de rever esses encargos ou até mesmo mudar as bases de cálculo. Em apenas um ponto não há divergência: é necessário reduzi-los.


Essas convicções ganham relevância em um contexto de acirrada concorrência internacionais, particularmente quando a valorização do real diante do dólar encarece o produto nacional.

No centro da formulação econômica do governo federal, percebe-se a sensibilidade para a necessidade cada vez mais latente de reduzirmos o Custo Brasil para sermos competitivos. A preocupação básica é com o emprego e a renda.

Exportar mais é gerar empregos aqui. Favorecer importações é gerar empregos lá fora. No plano interno, encarecer produtos e serviços significa prejudicar a inclusão das classes com menor poder aquisitivo, reduzir a demanda, a produção e os empregos.

Por isso, causou surpresa e forte indignação no setor empresarial a divulgação pela Previdência Social do novo Seguro de Acidente de Trabalho (SAT). Embalado por um legítimo e desejável discurso de estímulo aos investimentos empresariais na saúde e na segurança do trabalhador, o que se observa na essência é o brutal aumento do encargo social e a baixa efetividade no combate aos acidentes do trabalho.

O novo SAT tem dois pontos que, em conjunto, elevam a arrecadação da Previdência, mas precisam ser analisados separadamente para facilitar a compreensão. O primeiro ponto é o enquadramento dos riscos do ambiente de trabalho nas 1.301 subclasses (atividades econômicas).

De acordo com o risco de sua atividade, as empresas pagam um percentual sobre a folha salarial. Esse percentual é de 1% para atividades de baixo risco; 2% para risco médio; e 3% para risco elevado.

Ocorre que a Previdência, surpreendentemente, sem qualquer diálogo prévio e desejável, sem a devida motivação e publicidade, promoveu um reenquadramento que fez com que 866 subclasses (dois terços do total) tivessem suas alíquotas majoradas em 50%, 100% ou 200%.

Do outro lado, apenas 55 tiveram reduções. Tudo isto sem qualquer transparência nos cálculos. Estimativas da CNI apontam que somente o reenquadramento do SAT significará um aumento injustificável de 30% a 40% do encargo para o conjunto das empresas.

O segundo ponto preocupante é o Fator Acidentário de Prevenção (FAP), que é um multiplicador que varia entre 0,5 e 2, e está relacionado ao desempenho das empresas no trabalho de prevenção aos acidentes. A idéia do FAP é: quem se preocupa com o tema e investe, deverá ser bonificado (FAP menor que 1), e quem é negligente com a saúde do trabalhador será punido (FAP maior que 1).

Em reunião no Conselho Nacional da Previdência Social, o ministério apresentou os números: 3.328.087 empresas estão isentas do SAT por serem do Simples Nacional; 879.933 empresas seriam bonificadas (FAP menor que 1) e apenas 72.628 empresas seriam punidas. Com esses números e com uma proposta calcada na filosofia que premia o mérito, todos aprovaram.

Os problemas, contudo, só vieram à tona quando a Previdência divulgou o FAP das empresas. A partir daí ficou claro que a metodologia tinha muitos problemas técnicos, operacionais e legais, não atingindo os objetivos e gerando graves distorções frente à proposta, revelando ainda um forte caráter de aumento de arrecadação. A área técnica que desenvolveu a metodologia do FAP parece que entendeu a aprovação como um cheque em branco para cometer diversos equívocos.

Em relação à aplicação do FAP, como a grande maioria das empresas não tem qualquer acidente de trabalho, as mesmas estão no campo da bonificação. Contudo, a Previdência arbitrou um mecanismo (não aprovado) que coloca todas as empresas próximas de 1. Ou seja, quase todas as 880 mil bonificadas terão pequenos descontos (5%, 8%, 10%), mesmo sem qualquer acidente (esperava-se FAP=0,5).

Do outro lado, a metodologia jogou a maior parte dos grandes empregadores para próximo do limite superior do FAP, que é 2, o que implica elevados aumentos (70%, 80%, 90%) . A maioria das 72.628 empresas penalizadas não está sendo punida por não cuidar da saúde do trabalhador, e sim por ser grande, o que configura uma distorção.

Estimativas da CNI apontam que somente a entrada em vigor do FAP deverá significar aumento inaceitável de outros 30% a 40% para o conjunto das empresas, podendo este número ser ainda maior.

Portanto, a conjugação das duas medidas - o reenquadramento nas alíquotas do SAT e aplicação do FAP - significará um aumento bem superior a 60% na arrecadação desse encargo social, na contra mão de tudo o que a sociedade e os principais formuladores do governo defendem. O aumento do custo do SAT para a empresa poderá chegar a 500%.

No entanto, a efetividade da metodologia sobre a saúde do trabalhador será baixa. É importante destacar que, segundo dados da Previdência, o país tem 4.280.648 empresas com 747.663 acidentes de trabalho.

Ou seja, a média é inferior a um acidente por ano a cada grupo cinco empresas. Destes, 377.001 geraram custos a Previdência. Mesmo assim, precisamos continuar avançando nos esforços para garantir maior segurança no ambiente de trabalho.

Para completar, os problemas da metodologia do FAP abrem espaço para que todas as empresas, bonificadas ou punidas, entrem com recursos administrativos e judiciais para baixar o fator. Isto implica custos (Brasil) desnecessários para as empresas e para o Estado (Previdência e Justiça).

É por isso que esperamos a suspensão urgente dessas medidas. A Previdência precisa, a partir do diálogo social, fazer uma revisão profunda e transparente nas regras, deixando de lado o viés arrecadatório.

Contudo, para um ano rico em debates como será 2010, essas medidas equivocadas tiveram o mérito de antecipar a discussão de dois temas de alta relevância: a necessidade de reduzir encargos sociais para gerar emprego e reduzir a informalidade; e a necessidade de se construir políticas públicas mais inteligentes, completas e efetivas para proteção da saúde dos trabalhadores.

(*) presidente do Conselho Temático de Relações do Trabalho da CNI.



Fonte: Valor Econômico.


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